segunda-feira, 30 de abril de 2012

800 anos do foral de Alenquer (D. Sancha)


Foral de Alenquer de 1212 (pormenor)

Em nome do Padre, Filho, e Espírito Santo, Ámen.
Saibam todos que eu a rainha D. Sancha, filha d'el-rei D. Sancho, que foi filho de Afonso I, rei de Portugal, pela graça Deus, senhora do castelo chamado Alenquer, de minha espontânea vontade, bom ânimo e íntimo amor do coração, dou e concedo ao sobredito castelo e a todos os seus habitantes tanto presentes como futuros, bom foral, segundo o qual me serão pagos a mim e aos meus sucessores, por vós e vossos sucessores, os direitos reais abaixo designados. Dou-vos portanto como foro que aquele que voluntariamente, perante os homens-bons e com a mão armada devassar a casa alheia, pagará 500 soldos, e isso sem vozeiro. E se o devassador for morto dentro da casa, pagará ou quem o matar, ou o dono da casa, um maravedi; e se for unicamente ferido, pagará por isso meio maravedi. Pela mesma forma por homicídio e rapto feito publicamente, se pagará 500 soldos. Também quem ferir com pedras, sendo o delito provado pelo testemunho dos homens-bons pagará 500 soldos. Por meter porcaria na boca de alguém, se pagará 60 soldos, havendo testemunho dos homens-bons. Furto provado pelo testemunho dos homens-bons, será restituído nove vezes no seu valor. Quem quebrar o relego do vinho, e o seu vinho vender no relego, e for condenado pelo testemunho dos homens-bons, pagará a primeira vez 5 soldos, e a segunda vez 5 soldos, mas se ainda terceira vez for encontrado, havendo testemunho de homens-bons, o vinho será todo entornado e os arcos das cubas serão cortados. Do vinho vindo de fora darão de cada carga um almude e o resto será vendido nos relegos. Acerca das jugadas determino que até ao Natal do Senhor serão cobradas; e de cada junta de bois se dará um módio de milho ou trigo, conforme semear; e se semear de ambos os cereais, pagará dum e doutro pelo alqueire aforado da vila. E o quarteiro será de 14 alqueires e medido sem braço curvado ou rasoura. O cavador se semear trigo dará uma teiga e se semear milho o mesmo. E de geira de bois um quarteiro de trigo ou milho, segundo semear. E o parceiro de cavaleiro que não tiver bois, não dará jugada. E os habitantes de Alenquer poderão ter livremente lojas e fornos de pão e de louça; e dos fornos de telha darão décima. Quem matar um homem fora do couto pagará 60 soldos, e quem ferir um homem fora do couto pagará 30 soldos. Quem na estrada, com armas, ferir algum, pagará metade do homicídio. Quem puxar por armas, ou as for buscar a casa por ira, se não ferir pagará 60 soldos. E os homens de Alenquer tenham as suas herdades povoadas, e os habitantes delas pagarão por homicídio, por rapto, ou por meter porcaria na boca 60 soldos, sendo a metade para o mordomo da vila e a metade para o senhor da herdade; e irão ao apelido segundo o costume de Lisboa. E os homens que habitarem herdades de Alenquer se fizerem furto e for restituído como acima fica dito, a metade será para o mordomo da vila e a metade para o senhor da herdade. E a almotaçaria pertencerá ao concelho; e o almotacé será metido pelo alcaide e conselho da vila. E darão do foro, de vaca um dinheiro, e de veado um dinheiro, e de novilho um dinheiro, e de carga de besta de pescado um dinheiro, e de barco de pescado um dinheiro. E do julgado o mesmo. E da alcavala três dinheiros. E de veado, de novilho, de vaca e de porco, um dinheiro; e de carneiro um dinheiro. Os pescadores darão o décimo. De cavalo, ou mula, ou macho, comprado ou vendido por homens de fora, de dez maravedis para cima paguem um maravedi a mais; e de dez maravedis para baixo, paguem só mais meio maravedi. De égua vendida ou comprada darão dois soldos, e do boi dois soldos e da vaca um soldo, e do burro e burra um soldo. Do mouro e moura meio maravedi; do porco ou carneiro onze dinheiros. Do bode ou cabra um dinheiro. De cada carga de azeite ou de peles de boi, ou bezerro, ou veado, darão meio maravedi. De cada carga de cera darão meio maravedi. De cada carga de anil, ou de panos, ou de peles de coelhos, ou de peles vermelhas ou brancas, ou de pimenta ou de grãos, darão um maravedi. De linho, ou alhos, ou cebola, o décimo. De peixe de fora, o décimo. De gamelas, ou vasos de madeira, o décimo. De tudo isto que venderem homens de fora, se houverem pago a portagem, e comprarem outros objectos, não pagarão portagem alguma. De carga de pão ou sal, que venderem ou comprarem homens de fora, e de cada besta cavalgar ou muar darão três dinheiros; de cada besta asinina três mealhas. Negociantes naturais da vila, que quiserem dar soldada, receba-se-Ihes; se a não quiserem dar, paguem portagem. Da carga de peixe que homens de fora, levarem, darão seis dinheiros de portagem. Peões darão o oitavo do vinho e linho. Os besteiros têm o foro de cavaleiros. A mulher de um cavaleiro que enviuvar conserva as honras de cavaleiro enquanto não torna a casar; se casar segunda vez com um peão, fará foro de peão. O cavaleiro que envelhecer ou enfraquecer a ponto de não poder tomar armas, conserva os seus privilégios. Se alguma viúva de cavaleiro tiver um filho residente na sua casa, que possa fazer o serviço de cavaleiro, faça-o por sua mãe. O almocreve que viver de almocrevaria, pague o tributo uma vez por ano. Mas o cavaleiro que empregar o seu cavalo ou as suas bestas na almocrevaria, não faça (ou pague) nenhum foro como almocreve. O caçador de coelhos que for à soieira e aí ficar, dará uma pele de coelho; e quem aí permanecer oito dias ou mais, dará um coelho com sua pele. E o caçador de coelhos, de fora, dará o décimo todas as vezes que vier caçar. Os moradores de Alenquer que colherem pão, vinho, figos, ou azeite em Santarém ou outra qualquer parte, e que o quiserem conduzir para Alenquer para gasto seu e não para tornar a vender, não darão portagem por isso. Quem tiver uma rixa com qualquer e depois da rixa entra na casa dele e de caso pensado pegar num pau ou cajado e com ele o espancar, pagará 30 soldos. Se alguém de imprevisto e acidentalmente bater noutra, nada pagará. Inimigos de fora não entrarão na vila sobre o seu inimigo senão em caso de tréguas ou para alcançar justiça. Se qualquer cavalo matar alguém, o dono do cavalo dará o animal ou pagará o homicídio segundo escolher. Os clérigos têm o foro de cavaleiros em tudo, e se forem encontrados com alguma mulher em coito, o mordomo não Ihes tocará nem os prenderá de forma alguma, poderá porém prender a mulher se assim lhe aprouver. Da madeira que vier pelo rio, de que até agora davam oitavo darão o décimo. Da atalaia da vila deve a rainha ter a metade e os cavaleiros a outra metade com os seus corpos. O cavaleiro de Alenquer a quem o rico homem que em meu nome possuir a terra, tiver admitido à cavalaria e tiver dado terras ou bens, dos seus, eu o admitirei no número dos meus cavaleiros. O mordomo ou sayão não irão a casa de nenhum cavaleiro, sem levar consigo o porteiro do pretor; e o rico homem que em meu nome possuir a vila, não poderá meter alcaide algum que não seja de Alenquer. As casas que os meus nobres homens, ou freires, ou hospitalários possuírem em Alenquer, ou mesmo mosteiros, terão foro de cavaleiros. O gado perdido que for trazido ao mordomo, ele o guardará até ao fim de três meses, e em cada mês o fará apregoar para que se o dono vier o possa achar; se porém até ao fim dos três meses o dono não aparecer, então o mordomo poderá dispor do gado como coisa sua. Em cavalgada, o alcaide não tome nada à força, mas o que os cavaleiros espontaneamente lhe quiserem dar. De cavalgada de 60 ou mais cavaleiros, pagarão a meias comigo. O ferreiro, ou sapateiro, ou peleiro que possuírem casas em Alenquer e nelas trabalham, não pagarão por elas foro algum. Quem tiver oficiais de ferreiro, ou sapateiros, mouros, trabalhando em sua casa, não dê foro por eles. Mas os oficiais de ferreiro ou sapateiro que vivem dos seus ofícios e não possuírem casas, venham para as minhas lojas e façam-se meus foreiros. Quem vender ou comprar cavalo ou mouro fora de Alenquer, aonde o comprar ou vender aí dará a portagem. Os peões que houverem de hipotecar os seus haveres, deem de cima deles ao mordomo, e o mordomo assegurar-lhes-á a troco da décima, o seu direito; se porém recusar fazê-lo, fá-lo-á o pretor pelo seu porteiro. Os moradores de Alenquer não darão lutuosa. Os adaís de Alenquer não deem o quinto do quinhão dos seus corpos. Soldados de Alenquer não tenham zaga no exército. Os padeiros darão de foro da cada 30 pães um. As portagens e foros e quinto dos sarracenos e outros ficarão segundo o costume actual, salvo os que estão acima exarados ou que eu vos cedo. De alcaidaria, de cada besta que vier de fora com peixe darão dois dinheiros e de cada barco de peixe miúdo onze dinheiros, e de todo o outro peixe darão seu foro.
Quanto aos navios mando que o alcaide, dois remeiros, dois arrais e um calafate, tenham foro de cavaleiros. Isto tudo que está prescrito vos dou e concedo por foro; e para tudo ira o mordomo com o testemunho dos homens-bons e não o de outros. Os cavaleiros de Alenquer testemunharão com os infanções de Portugal. Todo aquele que observar este foro seja abençoado de Deus e de mim; quem porém o quiser infringir terá a maldição de Deus e a minha. Esta carta foi feita no último dia de maio de MCCL; eu supra nomeada rainha D. Sancha que esta carta mandei passar e roborei-a em Monte maior perante as testemunhas idóneas que assinam e presentes foram. D. Gonçalo Mendes, filho do conde D. Mendo - Gomes Viegas, filho de Egas Afonso. – Lourenço Egas, filho de Egas Henrique. - Martim Gonçalves, filho de Gonçalo o Sarraceno. - D. Egídio, filho de Rodrigo Fernandes de Lisboa. - Gonçalo Peres, filho de Pero Gonçalves de Pavia. - D. André, porteiro da rainha. - Fernando Gonçalves, escrivão da rainha, testemunhas.